Nunca sabemos se é a última ou as últimas?
Numa mesa de bar de uma tarde morna e sem graça tomavam chope dois velhos amigos. Estavam em um silêncio quase constrangedor até que Zé o irrompe sem saber muito que dizer:
Cara, nem te conto... Esses dias passei maior apuro.
É? Responde João com certo desinteresse que beira a melancolia.
Cê sabe minha namorada que mudou daqui, né?
Sim, sei. E...
Bom e daí que a mina ia cair fora, e nós estávamos na maior seca, e o pior? sem ter lugar para aliviar a tensão.
Mesmo? Sorvendo o chope lentamente.
Então no último dia dela aqui, quer dizer, nas últimas horas, estávamos nós esperando meus pais no estacionamento do banco, pois a única chance que tínhamos de ficar sozinhos era permanecermos no carro debaixo daquele calor infernal, mas nós ficamos.
E em meio a abraços e beijos, e a coisa esquentando, resolvemos descer do carro e ir para árvore imensa logo atrás da vaga onde estávamos.
Ela com uma bermuda curta e uma mini-blusa como empecilhos inexoráveis...
Empecilhos inexoráveis?
É, estava atrapalhando muito e...
Eu sei o que significa, mas essas palavras não combinam com a história, diga-se de passagem, uma estorinha chata para caramba.
Aé? Então escuta só, eu não te contei o que ocorreu antes disso. Queria fazer um flash-back, a la Eisenstein, mas já vi que você prefere o tradicional a la Griffith...
Ao o quê?
Ao o quê o caralho, a quem?
A deixa para lá...
É bom mesmo...
Vai... Adiante... O chefia desce outra rodada, beleza?
Então, na noite anterior ao lance do estacionamento, ela dormiu em casa, naquele que seria a nossa despedida, mas acontece que na noite anterior a esta, era meu aniversário, e eu e meu primo...
Que bosta, heim?, quantas noites e dias têm esta história, acho que não vai ter chope o suficiente para nos abastecer enquanto você a conta, não.
Caralho, cê qué ouvi a história ou não?
Sim, sim, prossiga.
O lance do primo é o seguinte, eu tinha ido a uma boate com ele, cheguei de madrugada e isso explica, ou pelo menos foi minha desculpa, para ter dormindo e não ter ido ao quarto de minha irmã, onde minha namorada dormia, para que depois que a minha irmã começasse a roncar, pois era o sinal de que já estava dormindo, tivéssemos, enfim, nossa despedida.
Pois bem, como disse, eu dormi. Quando acordei, o dia já estava clareando e mesmo assim eu arrisquei, e nas pontas dos pés fui até o quarto, subi na cama, e logo minha namorada acordou e sem perder tempo começamos, pois nisso, não é que a minha irmã desperta, levanta e sai do quarto? Aí eu pensei, fudeu, vai direto ao meu pai contar tudo. Nesse instante corri pelado juntando uma roupa aqui outra ali e fui direto para o meu quarto esperar o pior...
E quem diria, minha irmã levantou da cama sem ver que eu estava na cama ao lado com a minha namorada debaixo de mim. Ela tinha ido apenas ao banheiro e retornou ao quarto como se nada tivesse ocorrido e voltou a dormir.
Hum, sei...
O problema é que não dava mais tempo para tentar nada, meu pai logo acordou e a nossa despedida furou, por culpa minha, por ter dormido demais.
Ta legal sua estorinha, mas o quê que o acontecimento do estacionamento tem a ver com isso?
Muito, oras, foi no mesmo dia, estava com peso na consciência de não ter acordado, o desejo tinha aumentado, e aparentemente o estacionamento estava sem nenhuma alma viva.
Foi quando que, entre amassos e beijos debaixo da sombra da grande árvore, inspirado resolvi tentar a sorte, ela resistiu, mas consentiu, e começamos ali mesmo, perto do meio dia, a termos umas das sensações mais fascinantes até então, uma mistura de medo, desejo, atenção, tensão e prazer durante breves minutos que terminaram abruptamente, pois sem perceber um motoqueiro na sombra da árvore ao lado, dava um sorriso largo para gente, pois, ao que parece o mesmo estava ali, já fazia algum tempo, e assim ficou admirando a cena sem que, em nossa loucura íntima, tivéssemos percebido.
Quando nós o descobrimos, então nos entreolhamos, eu, ela e o motoqueiro, foi o mesmo que entrar no pólo norte, e se pudéssemos, teríamos escondidos nossas cabeças lá de vergonha, pois o mais tragicômico não foi não ter chegado ao êxtase, mas sim ter visto o vilão sair rindo safadamente para nós.
Depois tive que enfrentar a ira da minha namorada nas últimas horas antes dela viajar, pior não podia acontecer, depois disso, você já sabe...
Sei o quê?
Essa história dela lá e eu aqui...
Ahh sim, sei, como sei...
Ê, quê que foi? Qual é? Eu sou inseguro, mas tenho sentimentos, saio com outras, mas é por insegurança, falou?
Sei, claro, como não, ô garçom traz um escuro pra mim, continua no claro?
Claro.
E um claro para ele, firmeza?
Vamos fechar?
Sim pod...
Beleza, ô garçom! Aproveita e traz a conta, falou?
Linnus Schroeder
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